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quinta-feira, 12 de agosto de 2010

Minha vida de leitor (I)


Hoje resolvi dar início a minha história como leitor. Estão prontos? Apertem os cintos e vamos viajar em uma máquina do tempo para os longínquos anos 70.

Desde que me entendo como pessoa, lembro de estar com um livro nas mãos. A prova mais concreta deste fato é uma foto que tenho, tirada em 1978, quando eu tinha quatro anos e freqüentava o Centro Educacional Mickey Mouse, aqui perto de minha casa e há muito tempo já extinto.

Na foto, estou ridiculamente vestido de coelhinho da páscoa, para a festa de mesma temática. Um dos muitos rituais (micos) que temos que pagar no árduo caminho para uma vida adulta totalmente desprovida de fantasia e fofura. E em minhas mãos, um livro: a representação máxima da rebeldia que perpetrei naquele dia, pois minhas lembranças dele ainda permanecem bastante nítidas em minha mente.

Nas escolas onde estudei eu nunca fiz a linha sociável quando o assunto eram festas e confraternizações (e sempre era criticado por isso, especialmente pela minha família). E aquela festa de criança, em particular, simbolizou para mim o início e simboliza o ápice das festividades mais ridículas do mundo que tive de encarar. Estava odiando estar vestido daquele jeito, ao contrário de meu melhor amigo, o Augusto Júnior, que vivia com sua família na casa que ficava de fundos para a minha e que também estudava na mesmíssima escola.

As regras para o evento eram bem claras. Os alunos deveriam chegar à escola, tirar os sapatos ou sandálias e ficar descalços no pátio para uma dança. E enquanto a dança não começava, ficariam sentadinhos em roda, aguardando o início do "show".

Eu, que já não ia com a cara de alguns colegas (especialmente um tal de Fabrício, um loirinho com cara de estrangeiro que era com certeza mentalmente insano), recusei-me terminantemente a tirar minhas sandálias. Achava estranho ficar descalço fora de casa. Achava estranho aquelas coisas que nos obrigavam a fazer. Eu mesmo (não se assustem) já era um absoluto estranho que precocemente não suportava a si próprio nessa época, sempre fazendo a linha chorão, desajeitado e esquisito para o horror de meus pais.

Então fiz o que poderia fazer de melhor. Calmamente, peguei um livro de historinhas, um que falava da história de uma flor que murchava por causa de maus-tratos de seu dono (lembro bem da história) e sentei-me numa cadeirinha de balanço que havia em frente à escola, bem longe dos outros. E lá fiquei.

Na hora do show, haja apelos de professoras e pais para me tirar da bendita cadeira e de me tomar o livro. De nada adiantaram.E minha mãe ficou tão fula da vida que me pegou pela mão e já queria me levar para casa. Mas as professoras, que eram pessoas compreensivas, persuadiram-na a ficar e apreciar mais a festa.

Esse foi o meu primeiro ato de rebeldia contra as figuras paternas de que eu me lembro. E nas mãos, um livro.

Só levantei da cadeira muito tempo depois, na hora de comer chocolate e doces e para tirar a bendita foto, com o Junior do meu lado.

E nas mãos ele, o livro. Companheiro e válvula de escape de um momento tenso, em que ser criança foi difícil para mim. Para sempre eternizado numa velha fotografia.

P.S.: Que só não posto aqui porque está muito maltratada pelo tempo. Precisa de restauro. Por causa disso, dou-lhes o fofíssimo dublê na foto aí acima.

;-)

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